domingo, 10 de junho de 2018

Nessa vida, é preciso procurar aprender a silenciar.
Falamos demais. Exageramos na quantidade das palavras, no volume da voz, na amplidão dos gestos. Preenchemos tanto os espaços que banalizamos certas palavras, de modo que, se algo é bonito, logo dizemos que é lindo. E, quando encontramos outra coisa mais bonita, dizemos que é lindíssimo. E quando encontramos uma beleza ainda maior – porque sempre há uma beleza maior ainda não vista –, extrapolamos: é a coisa mais linda do mundo!
Hoje em dia, com o olhar distante, com telas mediando praticamente todas as relações, tentamos colocar calor no que dizemos. Logo amamos. Adoramos com pressa. Gostar é muito pouco, achar agradável é corriqueiro. Amamos com tanta facilidade e de forma tão rasa que, depois de reagir com “amei” a qualquer besteira, agora podemos amar com um botão, porque “curtir” ficou pequeno demais.
O que acontece é que, em certos momentos, vemos que não cabem mais superlativos e as hipérboles soam toscas. É quando as palavras fogem. Nessas horas, ficamos sem palavras porque não encontramos nenhuma que seja capaz de captar o que sentimos. E aí não é preciso dizer nada. Mas dizemos, desnecessariamente.
Por isso, é preciso buscarmos não falar, mas contemplar. Olhar, sentir, só. Isso já é tanto! É grandioso sem uma medida, sem bordas ou limites. É um tanto não quantificável, que satisfaz simplesmente. 
Sem falar, temos o silêncio, o espaço para a palavra ganhar sentido. Ali, a possibilidade de dizer é amplificada. No silêncio, as palavras, quietas, têm tempo para crescer. Sem pressa, elas aguardam as horas certas e, quando ditas, significam grandiosamente.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Agradecimento a cada ex

A todas as mulheres que eram "feministas demais", "noiadas demais", "chatas demais".
Às meninas que eram infantis, porque, no ápice de sua adolescência, lhes faltava maturidade.
Às jovens senhoras que já não tiveram mais paciência para aturar bobagens de menino.
Às moças que perderam dias alegres para acompanhar tristezas.
Às que sonhavam tanto em se casar e formar famílias. 
Às que nunca quiseram ser mães e não se importavam em viver sozinhas.
A quem suportou ridículos, denunciou absurdos, corrigiu erros.
A quem instruiu: "não é não!"
Às que deram o devido valor à amizade.
Às que agradeceram as flores e às que as jogaram fora.
Às céticas e às que apelaram para o ascendente em leão e para a lua em capricórnio.
Às minas de fé.
Às que não tiveram medo e arriscaram.
Às que foram firmes na sua fluidez.
Às que convenceram de que não se vê a profundeza pela superfície. O mergulho tem que ser muito mais fundo mesmo em águas transparentes.
Às que contaram histórias com delicadeza e com raiva.
A quem expôs traumas. 
Às que, pacientemente, mostraram cada lugar e apontaram caminhos.
A quem insistiu na paixão, no olho no olho, no amor que transborda das coisas pequenas.
Àquelas que deram ao corpo a importância que o corpo tem, que souberam ouvir e ensinaram a ouvir com todos os sentidos.
Às que se deram ao trabalho de explicar o óbvio.


Agradeço.

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

"Quanto tempo vive um inseto"

Domingo: olha só aquela minimariposa ali.

Parece que falta assunto, não parece? Parece que a gente já deu o que tinha que dar. Que tem que focar nos assuntos corriqueiros pra poder continuar dando certo.
Mas e esse tom de voz? E esse olhar de desdém? Pra quê isso? A gente não se ama, afinal? Por que agir assim?

Segunda: e aquele inseto continua lá no teto do banheiro.

Já não há mais nós. O problema não é você, sou eu. É por minha culpa que não te amo como acho que deveria. O amor que sinto é tanto e é por isso que não te respeito, por essa louca paixão. Não, não é possessão. Nem ciúme. Nem é problema exclusivo meu. É algo que veio com nosso amor, sabe? Eu era uma pessoa ótima, fui me estragando contigo. Você que me deu essa insegurança, mas foi porque fui maravilhosamente bem tratado. Você me acostumou mal. Mas depois me maltratou. Muito. Repetidas vezes, sem querer e de propósito. É assim mesmo, só que agora já cansou. Fim.

Terça: olhei aquela pequena mariposa e chorei. Bonita e finita. Ainda vivia, mas eu sabia que ela ia morrer.

Eu só, só pensava em tristeza. Tudo era triste. Não havia ânimo pra quase nada. Não conseguia sequer imaginar como veria esse momento no futuro. É mesmo preciso passar por isso? Será que não tem volta? Como é sofrido, meu Deus!

Quarta: eu vou matar esse bicho.

Eu procuro tanto esquecer, mas não tem como. Se esse negócio ainda nem morreu, como que eu vou conseguir superar tudo nesse curto período?

Quinta: nem prestei atenção, deixa eu ir lá conferir. Tá lá. O bichinho ainda não morreu.

Será que não é orgulho? Não há volta mesmo? É definitivo, então?

Sexta: ela ainda tá lá, só mudou um pouquinho a posição. Não é possível. É um lembrete do quanto tudo é recente. É? É por isso que dói tanto assim? Deixa eu ver aqui quanto tempo ela vai viver. Vinte e quatro horas? Como é que pode? Eu vou matar essa coisa. Já não era pra estar mais viva mesmo.

Já chega, tudo termina mesmo. Conforme-se!

Sábado: a minimariposa desapareceu.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Expectativa

Silêncio.

O telefone vibra uma vez.

Silêncio.

Vibra outra.

Quem será? O que será?

Sorri. Imagina. Esquece, não deve ser. Tu precisas mesmo dormir mais, viu? Essa mania de ficar acordando cedo quando não precisa. Fica aí delirando, esperando a possibilidade, torcendo tanto, mandando pensamentos pro universo na esperança de ser atendida, que não se lembra de viver. Nem sabe o que quer e quer tanto. Menos, batista! Menos!

Vibra outra vez. E outra e mais uma.

Ué! Quer saber, vou ver o que é.

O telefone não para.

Mas era só o despertador.


domingo, 1 de novembro de 2015

Experimente falar

Em 2011, escrevi: "isso não é sobre ficar junto, é sobre ter coragem de sentir". Aqui estou, quatro anos depois, desencorajada.
Parei de escrever por um tempo porque comecei a pensar que isso tudo é pessoal demais. Mas e o que não é? O que é que vivemos que permanece na impessoalidade?
Depois de quatro anos, volto pra esse rascunho de texto, um dentre tantos que julguei inacabados. Voltei pra escrever sentimento, não constatação - inclusive é engraçado ver que quanto mais nova eu era, mais segura de mim, mais cheia das teses sobre tudo. Tão errada sobre tantas coisas!
Cansei da escrita formal, com propósito definido, e voltei pra escrita que funciona como sonífero, que me deixa dormir depois de vomitar pensamentos digitados em teclado minúsculo de celular.
Voltei com palavras entaladas, sentimentos presos, imaginação limitada. Não consigo dizer o que acho que devo, não tenho mais a coragem pra arriscar, pra alcançar o quero. Pior. Nem sei se quero de verdade ou se é só uma memória que me atormenta.
Economizar palavras pra quê? Elas entaladas não servem pra nada.
Na época em que comecei a escrever isso, minha mensagem era: fala, criatura! Se joga nesse mundo que a vida é uma só!
Agora eu li e me envergonhei. Primeiro, da minha inconsequência de antes, e, depois, da minha covardia atual.
Na época, meu conselho não servia pra coisas ruins. Segundo eu mesma, desgraça suficiente já acontece por acaso, ninguém precisa estragar nada de propósito. Portanto, se a notícia for ruim, cale-se. Mas se for boa, grite! Sábia.
Eu não entendia porque alguém vive tão cheio de segredos. Não percebia que existem coisas que simplesmente são silenciosas e permanecem assim, às vezes pra sempre.
Se todas as músicas de amor tivessem sido reveladas, muitas histórias poderiam ter continuado. Certamente. Mas será que seriam boas histórias?

terça-feira, 3 de março de 2015

Toda vez que lembro choro como se fosse a morte de uma pessoa. A morte de um eu que faleceu recém-nascido. Tão jovem, tinha a vida inteira pela frente.

sábado, 17 de maio de 2014