terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Desperdício pra quem?

  Em tempos complicados de preservação, reutilizar e fazer valer cada gota são ordem.
  Cadê o meu direito de dar errado? 
  Era bom quando dava para amassar aquela folha de papel só para passar a limpo. Era bom poder jogar fora coisas que não serviam mais, sem tentar ajustar ou reposicionar. Mas gente que faz isso não é mais bem-vinda. Só há espaço para cidadãos do bem.
  Estão sendo tomadas diversas atitudes para a preservação da humanidade tamanha prepotência e burrice que temos. Primeiro fazemos tudo para deixar o mundo confortavelmente habitável, depois nos contentamos com reduções e cortes. Depois de termos feito tanta besteira, achamos que nunca é tarde para corrigir. 
  Felizes, devemos nos ensaboar de chuveiro desligado, maneirar na comida que colocamos no prato, pensar bem antes de comprar aquela roupa colorida. Felizes, ouviram? Sorrindo para a foto.
  Não cometam o erro de perder um segundo sequer sem ter recuperado um relacionamento, feito alguém feliz, perdido calorias e aberto um negócio. O mundo gira num ritmo econômico-sócio-emocional acelerado, devemos acompanhar. Tudo isso em harmonia com a natureza. Vivendo assim vamos viver mais e melhor! Não dá para desperdiçar pessoas, tempo, energia, dinheiro, plástico...
  Essa é a moda da vez. Vamos ver até quando isso valerá.
  Evitar desperdícios é atrativo, mas tem desvantagens. Ao economizar passos, corre-se o risco de viver de redondeza. Para quem atrai ser imóvel, é bom. Para quem não suporta o mesmo lugar, é ruim. Depende da necessidade de cada um. Depende do que é necessário. O bem comum é muito complicado.  
  Gente é individual e subjetiva. Pensar em qualquer coisa comum é extremo. Definir ideais comunitários chega a ser utópico, mas é um passo para efetivar objetivos. Só é importante lembrar eles até dar cabo à tarefa. Acontece que gente também é muito maleável, esquecida e preguiçosa. Além de adorar uma moda!
  Se a moda é repensar, vamos! Vamos repensar o consumo, inclusive o de ideias prontas e fragmentadas que daqui a pouco a moda é outra. 
  Mas sabe aquele casaco clássico, preto, que sempre está em alta? É como bom senso: combina com tudo. 

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Quarta (depois de Terça)


Do bailinho ao trio elétrico o som foi abaixando. O movimento nos bares já diminuiu. 
É sempre assim o fim do Carnaval.
Depois de quatro dias de festa, até o dia seguinte pede pausa de tanto brilho e cor. 

Fico feliz por dessa vez ter ouvido menos reclamação, menos "enquanto o povo pula, os corruptos estão livres pra fazer a festa". Sério, gente chata, tem 361 dias pra cuidar da vida durante o ano. Dá tempo. Não me venha tirar o direito de fingir que tá tudo bem.

Às vezes rola uma cara emburrada no meio da folia, mas com o dedinho levantado, festivo.
Problemas sempre existem e não vão parar por causa do Carnaval. Quem se dispõe a sorrir, pisoteia neles, sufoca com confete, afoga com cerveja.
Ainda bem que não precisei me preocupar com nada sério e pude optar pela ilusão da música animada, da desordem no meio das ruas, da maquiagem. Vezes quatro.

A necessidade de exagerar na comemoração vem de antes, muito antes de mil novecentos e cinquenta e alguma coisa. Mesmo quando falta ânimo, há a desculpa: é Carnaval!
Parece imposição, mas se escolhe viver essa alegria fugaz (obrigada pelas palavras poéticas, Chico Buarque!). Não deixo passar. Comemoro, nem que seja como "tributo".
Aproveito a lisonjeira oportunidade de ver o comércio fechando pro bloco passar e vou.
Vou, feliz, vendo as pessoas cansadas insistindo em pular sem querer desperdiçar um dia sequer dos quatro dias (pra mais) de festa. 
Vejo cada paralelepípedo da velha cidade se arrepiar ao lembrar que lá passaram sambas imortais. Também me arrepio e canto os mesmos sambas. Refaço um percurso ancestral que certamente se repetirá, como aconteceu até agora.
Carnaval cíclico, repetidamente.



sábado, 2 de fevereiro de 2013

Nada a ver - chorumelas sobre ser professora estagiária


Apesar de viver mais de onze anos frequentando uma escola até chegar à universidade, quando chega o momento de ser professor, surge um frio na barriga. A inversão de papéis, de aluno para professor, é permeada por insegurança e entusiasmo. O período passado na faculdade é tão distante da realidade escolar que faz com que a volta à escola, ainda mais como professora, seja estranha para mim. “A escola” e “os alunos” foram tomados de modo tão abstrato na graduação que fez com que eu me distanciasse de algo que era corriqueiro, que fazia parte do meu cotidiano.
No curso de licenciatura em português da UFSC, começamos a tocar no assunto “ensino” apenas a partir da quinta fase. As disciplinas, em geral, não são suficientes para nos reaproximar do contexto escolar.
Estudamos algumas teorias, porém são reservadas poucas horas para problematizá-las e visualizá-las na prática. Mesmo com uma carga “pesada” de leitura, não temos tempo reservado para dialogar com os textos. São raras as oportunidades de propor questionamentos a outros profissionais da educação, a textos, a autores. Somos, enquanto alunos, acostumados a restringir nossa visão à visão do professor.
O professor “filtra” aquilo que devemos conhecer, produzir e reproduzir. Assim, acabamos repetindo um comportamento automaticamente. É criado em nós um comodismo que nos contenta com a amostra que temos na graduação. Ao invés de abrir as portas para um mundo de opiniões e experiências, vivemos dentro da “casinha” da universidade, desacostumados com diferenças e surpresas.
Por isso é essencial cursar o estágio de docência antes de recebermos um diploma. Ideal seria que tivéssemos mais oportunidades de inserção em sala de aula, mesmo em momentos apenas de observação, porque precisamos supor situações reais para aplicarmos o que aprendemos. Se já é complexo planejar atividades a uma turma específica e real, é mais difícil ainda abstrair e imaginar um grupo de pessoas “possível”. Não existem pessoas “possíveis” no mundo, existem pessoas reais
Duas realidades são conhecidas com o estágio: professores estagiários conhecem a escola e a escola conhece o que acontece na universidade.
O intercâmbio entre ambiente de pesquisa e de atuação é produtivo, instigador. A instituição escolar ganha e os alunos/professores estagiários crescem, expandem a visão. O crescimento é pessoal também, se considerarmos que, ao lidar com pessoas, o trabalho ultrapassa a mecanicidade.

Algo que incomodava no percurso da graduação era não serem ditas “fórmulas” de como lidar, nem como depoimento. Como aluna, me sentia perdida, sem ter para onde recorrer em caso de emergência. Mas depois de ser professora entendi, verdadeiramente, que não há como um modo de fazer funcionar em toda situação. Emergências podem surgir, mas vêm sem aviso e dependem de muitos fatores para serem resolvidas, incluindo reflexão e amadurecimento de ideias. Talvez por isso meu julgamento sobre a forma de como cursos e manuais são abordados seja um pouco “tendencioso”.
Não funcionam as fórmulas mágicas, os planos perfeitos. Nenhum livro didático, nenhum guru do conhecimento parece ser suficiente na hora do apavoro. Nenhuma dessas soluções encantadas conhecem de verdade o lugar onde são aplicadas. Por isso o diálogo com diversas pessoas – inclusive com alunos – em variadas situações é essencial. Não podemos contar com o suporte apenas de teorias que não conhecem o terreno de cada escola.
Os “teóricos” abstraem extremamente a ciência “criada em laboratório” para que se encaixe em contextos distintos. As teorias compõem as diretrizes e os manuais dos professores das escolas, mas os professores não conhecem de modo pleno as teorias seguidas. Como estagiária, a obrigação carregada é de conhecer as teorias, conhecer a escola e adequar uma a outra, num movimento “redondo”, planejado para que ocorra sem falhas.
Entretanto, mesmo sendo a experiência mais valiosa da graduação, o estágio continua nos moldando. Por acaso (e por sorte), com orientação e escola abertas e colaborativas, foi gratificante todo o  meu período de estágio, o que não excluiu algumas formalidades e adequações.
Na elaboração dos planos de aula e dos projetos de docência e extraclasse foi exigido rigor a uma corrente teórica, como se na vida real as idéias não pudessem conviver e até se completarem. Ao contrário, o tempo todo convergem, divergem, se refazem.
Claro que é imprescindível a formação acadêmica e o traço de um caminho coerente, mas não podemos abrir mão da sensibilidade do professor, ser humano que lida com outros seres humanos.
Como estagiários, nossas funções se restringem a dar continuidade a algo em andamento. Devemos nos moldar.
Devemos. No entanto, o que fiz(emos) foi diferente.
Os alunos, as professoras, o “eu” que volta e meia aparece puro na frente da turma são mais fortes que o passo a passo dos planos. Olhando, observando com disposição para aprender e construir conhecimento faz do professor amigo, conselheiro, facilitador e orientador, que alcança seus objetivos traçados (lapidados!) mesmo que por outros caminhos e descobre objetivos atingidos que jamais foram imaginados. Levar a profissão de um modo exageradamente emocional é desaconselhável, mas, pelo menos para mim, não há como criar uma barreira exclusivamente profissional quando se é professor.
Mas quem diz isso sou eu. Cada um sabe de si e só vivendo para aprender.